quarta-feira, 20 de janeiro de 2016

Maranguape - Década de 30



A cidade que viu Chico Anysio nascer (Rascunho)


Década de 30

A pacata cidade de Maranguape, distando apenas 26 quilômetros de Fortaleza, de clima agradável, tendo por franja uma verdejante serra, constituía-se na grande atração dos fins de semana para o povo de Fortaleza. Banhos de águas frescas em cascatas perenes, acolhedores sítios às margens do Rio Pirapora, tudo era um convite para o lazer dos jovens e adultos que chegavam à cidade em animados passeios de trem com horários especiais aos domingos.

Rio Pirapora. Créditos da foto: Erisson Magalhães


Muitos dos visitantes tinham parentes na cidade e aqui chegavam já na manhã de sábado. Várias opções de lazer tinha a cidade em si mesma, adequadas a cada idade dos visitantes. Os mais novos, armavam-se de atiradeiras e punham-se nas matas a perseguir a passarada, copiosa em variedade. Os mais velhos, reuniam-se no bar do Sr. Sinfrônio do Nascimento – O BAR SINFRÔNIO, atraídos pelos bilhares, onde disputavam campeonatos com os da terra. 


Da esquerda para a direita: Robert Braquehais, Gerardo Paula e jornalista Antônio Campos de Oliveira - Frequentadores do Bar do Sinfrônio na década de 50.


Havia os sorvetes, conservados na única geladeira da cidade, graças ao pioneirismo do proprietário do bar. Nas animadas rodas dos que se postavam ao lado dos bilhares, era servido o café sempre quente, guardado nos bules cobertos por abafadores. Num ou noutro momento, acodia o Sr. Sinfrônio à solicitação de um recém-chegado chauffeur, para abastecer seu Ford de Bigode, no único também posto de gasolina da cidade.

Ford A Phaeton 1929, o Ford Bigode. Imagem ilustrativa. Créditos: Portal Estadão.


Na maior praça da cidade, a Praça Barão de Aquiraz situa-se o mais importante prédio da cidade, o Solar dos Sombras, um repositório dos mais vibrantes fatos históricos do município. Foi neste solar que a família Sombra recebeu o romancista José de Alencar, quando este visitou nossa cidade. No tempo da escravidão, foi nos salões desse solar que a sociedade de Maranguape, em coro com os movimentos abolicionistas que sacudiam Fortaleza, sediou o primeiro Congresso Abolicionista do Brasil!

À noite, na cidade podia-se frequentar o Teatro S. José, fundado pelos artistas da Sociedade ARTÍSTICA MARANGUAPENSE, entidade de que era Presidente desde a sua fundação o devotado Domingos Façanha. As peças levadas à cena eram em sua maioria de um dramaturgo conterrâneo, o João Bayma, com artistas pinçados dentre a sociedade local. O cinema que a Artística havia sustentado durante alguns anos, incendiara-se havia pouco tempo.

Na esquina oposta, em local privilegiado por se situar defronte a Praça Municipal, mais conhecida por Avenida, situava-se o Cine Teatro Ideal, ou simplesmente Cinema do Chico Moura. Era ainda a época do cinema mudo, pelo menos para a nossa cidade. Mas o silêncio técnico das cenas era superado pelo acompanhamento ao piano de respeitosas senhoras da sociedade, que procuravam dar realismo aos ruídos que o projetor não reproduzia.  Mas era nos fins de semana que a afluência era maior. Aos sábados, chegavam à cidade os farinheiros, como eram conhecidos os mercadores que vinham para as feiras de domingo. Eram frequentadores certos do cinema do Chico Moura. Mas como eram inconvenientes! Teimavam em fumar cachimbo no salão e em conservar na cabeça os seus imensos chapéus, para desgraça da assistência mais nobre, que se aboletava em cadeiras de palhinhas, separadas da Geral por uma robusta grade. 

 
O cinema já com o nome de Maragoa, já no ano de 1972.

O Teatro S. José e o cinema do Chico Moura, além dos bilhares do Sr. Sinfrônio, dominavam as noites dos maranguapenses. Vez por outra em determinados sítios, a caboclada dos bairros Guabiraba e Outra Banda encenavam peças folclóricas, que sempre atraíam um público cativo.

Nos meses de Janeiro e Setembro, havia as festividades religiosas de S. Sebastião e N. S. da Penha. A estrada Maranguape - Fortaleza ainda não apresentava condições satisfatórias para o tráfego noturno de veículos, e assim, os ônibus da recém-fundada linha de José Mavignier (O Cazuzão), não se prestavam para trazer de Fortaleza os habituais frequentadores dessas animadas quermesses. Era quando a Rede Viação Cearense colocava trens especiais, que chegavam lotados da animada mocidade de Fortaleza. Na Avenida, agora modernizada por uma bela praça, inaugurada em 1931, brilhavam lâmpadas elétricas, que resplandeciam em luminosidade, motivo de inveja em todo o Estado.

Os leilões enchiam de contos de réis os cofres da Igreja! E como eram animadas as novenas! O céu da Praça da Matriz iluminava-se vez por outra pela explosão de fogos de artifícios. Também de surpresa, o violento estrondo de uma ronqueira espalhava a moçada na praça fronteiriça! Mas a grande afluência de público se verificava nos dias finais de quermesses: na última noite de novena e na missa matinal do dia do santo festejado. A última noite de novena é ainda precedida de uma concorrida procissão. Por aqueles tempos, era tradição as famílias ornamentarem as varandas das fachadas de suas casas com toalhas e flores. As flores eram jogadas no andor do santo ou da santa, quando passava diante das casas. Das janelas da Rua Major Agostinho, a rua burguesa da cidade, com prédios revestidos de azulejos portugueses, orgulhosas matronas aplaudiam o final do cortejo, quando então passava a imagem referenciada. 

Missa da Padroeira N. Senhora da Penha em Setembro/2015.


O sobrado hoje em ruínas, que se situa na esquina com a travessa Afro Campos era a mais imponente edificação da rua e testemunhava a nobreza de seus moradores. Logo mais, estes desceriam à Avenida, para arrematar as mais cobiçadas prendas do leilão.

Foi bem no início desses áureos tempos que nasceu em nossa cidade aquele que viria a ser o maior humorista do Brasil, para orgulho de nossa gente – Chico Anysio.

Evandro H. Carneiro
22 de novembro de 1994

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